Os doentes com depressão grave e que sofrem de outras perturbações psiquiátricas, nomeadamente relacionadas com ansiedade, têm melhor qualidade de vida em termos de relações sociais, do que aqueles diagnosticados apenas como depressivos, segundos especialistas.
Este é um dos dados preliminares de um estudo sobre qualidade de vida e depressão, a apresentar quinta-feira, no III Congresso Nacional de Psiquiatria.
A investigação, desenvolvida em colaboração com o Grupo Português de Avaliação de Qualidade de Vida da Organização Mundial de Saúde (OMS), indica que os doentes deprimidos e que padecem também de outras perturbações apresentam menos sintomas depressivos e melhor qualidade de vida em termos de relações sociais, do que aqueles cuja sintomatologia se reporta unicamente à depressão.
«Estes dados sugerem que a depressão quando comparada com outras formas de psicopatologia, se constitui como muito invalidante para o indivíduo», disse à Lusa Sofia Gameiro, uma das três autoras do estudo.
A qualidade de vida foi avaliada nas vertentes do bem-estar e funcionamento físico e psicológico dos indivíduos, da satisfação em termos de relações sociais e com o ambiente circundante.
Dado a investigação apenas envolver 52 pacientes em tratamento, a investigadora sublinhou que os resultados por agora não devem ser generalizados.
Os dados recolhidos indicam também que doentes submetidos a uma terapêutica mista (medicamentos e psicoterapia) apresentam melhor qualidade de vida física e menos sintomas físicos resultantes do mau funcionamento psicológico (somatização) como alteração dos padrões de sono, ao nível da memória e raciocínio ou dificuldades de concentração.
Quanto à sintomatologia depressiva, não foram encontradas diferenças entre os tratamentos misto e o exclusivamente de terapêutica psicofarmacológica.
«Estes dados sugerem assim que a componente de psicoterapia poderá contribuir para um maior bem-estar dos indivíduos e salientam a importância que as medidas de qualidade de vida podem ter enquanto critério de avaliação das práticas clínicas implementadas», resumiu a investigadora.
A investigação refere também que as mulheres deprimidas apresentam pior qualidade de vida de que os homens, especialmente no que respeita ao bem-estar físico.
«Desta forma, a depressão, para além de afectar preponderantemente o sexo feminino parece também ter um impacto mais severo neste grupo específico», lê-se no resumo do estudo.
Os dados preliminares corroboram os « resultados esperados», comentou ainda Sofia Gameiro à Lusa, ao mostrarem que os doentes com diagnóstico clínico de depressão apresentam pior qualidade de vida, quando comparados com indivíduos saudáveis, e que as condições de vida pioram na proporção de um maior grau de severidade dos sintomas depressivos.
Refere-se ainda que os doentes deprimidos tratados em regime de internamento apresentam também pior qualidade de vida que os pacientes seguidos em consulta externa, e que os indivíduos com episódios depressivos recorrentes têm também mais dificuldades no seu quotidiano em comparação com os que apenas apresentam um episódio depressivo.
«Estes dados realçam o impacto negativo da severidade e duração da doença, apontando para a necessidade de medidas preventivas e, quando estas falham, de um diagnóstico e intervenção precoce», sublinha-se no estudo.
A depressão Major (grave) é considerada uma doença de carácter crónico, que tem um impacto muito significativo na vida do sujeito, na família e na sociedade.
Classifica-se, segundo o manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais, como sendo uma perturbação do humor, de gravidade e duração variáveis, que se faz acompanhar de vários sintomas físicos e mentais.
Este tipo de patologia surge no contexto clínico como uma das doenças psiquiátricas mais frequentes, que afecta ao longo da vida cerca de 10 a 25 por cento das mulheres e aproximadamente metade dessa percentagem no caso dos homens.
Segundo alguns estudos da Organização Mundial de Saúde, referidos pelo Ministério da Saúde em 2006, em Portugal, estima-se que a depressão afecte cerca de 20 por cento da população, sendo a principal causa de incapacidades e a segunda causa de perda de anos de vida saudáveis entre as 107 doenças e problemas de saúde mais relevantes, representando assim um grande custo económico para o Sistema Nacional de Saúde.
Os mesmos estudos estimam que esta doença esteja associada a 850 mil mortes a nível mundial, sendo que destas mais de 1200 ocorrem em Portugal, facto que, na sua maioria, está associada a taxas elevadas de suicídio.
A apresentação da investigação, da autoria de Maria Cristina Canavarro, Sofia Gameiro e Susana Silva, acontecerá quinta-feira, no Congresso Nacional de Psiquiatria, a decorrer no Centro de Congressos do Estoril até sexta-feira.
Diário Digital / Lusa